Carlos Amadeu é apresentado como técnico do Vitória pelo presidente do clube, Paulo Carneiro — Foto: Thiago Pereira
Funcionário do Vitória por quase uma década em duas passagens, na década de 1990 e nos anos 2000, Carlos Amadeu ganhou títulos e prestígio como técnico das categorias de base. Em 2014 e 2015, teve a experiência de assumir o time principal interinamente por alguns jogos e deixou o clube na sequência para trabalhar nas divisões inferiores da Seleção Brasileira. Nesta terça-feira, após quatro anos afastado, o treinador retornou para a Toca do Leão para ser apresentado como treinador do time profissional.
Soteropolitano e ex-jogador com passagem por clubes da Bahia, Carlos Amadeu não escondeu a satisfação por, finalmente, estar à frente do time principal do Vitória. A própria família do treinador está ligada ao clube. O filho caçula atua no time sub-15 rubro-negro, enquanto o filho mais velho é o técnico da categoria. Durante a primeira entrevista coletiva na Toca do Leão, o novo técnico rubro-negro afirmou que realizou um sonho.
– Todo esse conhecimento que você traz, faz parte do DNA do Vitória. A gente se sente muito orgulhoso. Poderia ter acontecido muitos anos atrás, mas acho que Deus dá o momento certo. Me sinto maduro, preparado, rodado e com a cara do Vitória. Um cara que trabalhou aqui desde 1991 e viu o clube ser reconstruído. Já existia, mas se transformou em um clube ainda maior. Passa a ser reconhecido por suas divisões de base. Tenho orgulho de fazer parte desse DNA, participar desse processo de construção nos anos 90, de minha última passagem entre 2009 e 2015, onde a gente pôde construir bastante. Onde passei, fui muito respeitado. Todo mundo sabe quem é o Vitória, reconhece o Vitória como clube formador – comentou Amadeu.
"O sonho de treinar uma equipe profissional, eu sabia que seria o Vitória. Era inevitável", diz Carlos Amadeu.
Carlos Amadeu assume o time do Vitória em substituição a Osmar Loss, demitido no último domingo. Ele será o quarto treinador do ano. Pela Toca do Leão, também passaram Marcelo Chamusca e Cláudio Tencati. Amadeu foi questionado sobre a alta rotatividade do cargo dentro da Toca do Leão e por qual motivo acha que conseguirá ter um destino diferente dos antecessores.
– As vitórias. As vitórias, as conquistas. É o que vai nos fazer permanecer no cargo. A gente sabe a cultura do futebol brasileiro, que todos nós participamos dela. É um contexto, uma conjuntura. A gente precisa, de forma gradativa, ir mudando essa cultura. Mas, enquanto não mudamos, a gente tem que conseguir o resultado. Nesse quesito, a gente consegue controlar alguns fatores. Treinamento, alimentação, descanso. A gente pode controlar até a performance da equipe através do treinamento. Mas não pode controlar as intempéries do futebol, mas não pode controlar o resultado.
O técnico volta ao Vitória com contrato válido até o fim do ano. A estreia será no próximo sábado, às 19h (de Brasília), contra o Paraná, no Barradão. Amadeu espera que a mudança na comissão técnica possa trazer um fator positivo para o jogo do fim de semana.
– Cada mudança corresponde a uma mudança de metodologia, de forma de comunicação, uma forma de trabalho. Tudo isso vai afetar. A gente espera que seja de forma positiva. A gente acompanha o futebol e sabe que tem as mudanças que são benéficas, que acontecem, de forma positiva. Estou vendo o Vitória numa mudança positiva. A gente pensa em aproveitar o que tem de bom, porque já tem uma construção positiva. Percebemos uma qualificação de jogadores que foram chegando ao longo do processo. Os últimos resultados dentro de casa foram positivos. A gente tem que saber aproveitar esse momento que é positivo dentro de casa.
No período em que esteve fora do Vitória, com licença sem remuneração, Amadeu foi campeão sul-americano invicto em 2017 e terceiro colocado no Mundial pela Seleção Brasileira. A demissão das categorias de base do grupo sub-20 ocorreu no início desta temporada, após o fracasso no Sul-Americano. O Brasil terminou a competição em quinto lugar, fora do G-4, zona de classificação para o Mundial Sub-20 – ficou fora pela terceira vez nos últimos quatro torneios.
Confira outras declarações do treinador:
Das categorias de base ao profissional
– Sempre fui um treinador que militei nas categorias de base, mas que sempre estive atualizado no futebol profissional e futebol mundial. […] Em 2014, era treinador do sub-20 e apenas fiz dois jogos em uma mudança de técnico. Fui interino em 2015. Estou realizando um sonho, é uma grande oportunidade. As pessoas sempre falam: na dificuldade é que nasce uma oportunidade. Estou tendo essa oportunidade e acredito na mudança de patamar, de status. Acredito que a gente pode fazer um trabalho decente e que consiga no final do ano comemorar.
Desafio
– Diria que começar um trabalho, iniciar, no início do ano, é sempre melhor. Mas a gente tem que estar preparado para assumir em situações adversas. Todas as vezes que assumi algum clube, assumi em situações adversas. A própria seleção brasileira. Os desafios sempre foram grandes. Sempre topei, encarei e cresci com isso. Espero crescer com o Vitória.
Psicológico x pressão
– Quem não aguenta pressão não pode trabalhar no Vitória, no futebol brasileiro, no futebol baiano. O torcedor tem uma identificação comigo. Se sente representado por um baiano, por uma pessoa que veste a camisa do clube, que conhece o clube, que tem a raiz, o DNA do clube. Diria que é chão de fábrica. Uma pessoa que se preparou para isso. Além de ter jogado futebol, passado por todas as categorias de base, experiência internacional que o clube proporcionou, acho que a gente está sempre aprendendo. A identificação com o torcedor é fundamental para o crescimento do clube. Torcedor entender que o momento é delicado e que só tem uma forma de reverter a situação, que é unido, trabalhando junto.
Últimos meses
– Fui procurado pelo Vitória duas vezes quando estava pela seleção. Fui procurado pela antiga gestão na saída de Marcelo Chamusca. Agora com Paulo Carneiro. (…) Quando saí [da Seleção], imediatamente vim ao Vitória, me apresentei, conversamos a respeito com Ricardo David, e ele me liberou para que pudesse viajar para a Europa. O objetivo era que pudesse acompanhar o futebol internacional, fazer contatos e aproveitar para dar uma descansada. Depois fui efetivamente dar aula nos cursos de formação de treinadores da CBF, que continuo ministrando aulas quando sou solicitado, e acompanhando todos os jogos de todos os clubes que pude acompanhar.
Defesa
– A gente precisa quebrar um pouquinho o paradigma que o sistema defensivo está vinculado a dois jogadores, assim como o sistema ofensivo está vinculado ao 9. O sistema defensivo envolve todos os jogadores, assim com o sistema ofensivo. O melhor marcador que existe chama-se o sistema. Quando o sistema está organizado, coeso, andando junto, dificulta muito a ação do adversário. Para isso, precisa de tempo. Não tenho entrosamento com o meu parceiro se jogo um jogo e depois sou trocado. O Vitória fez montagem e remontagem de equipe durante todo esse processo. O entrosamento ´só vai acontecer com o tempo e tem que acontecer o mais rápido possível. À exceção do jogo contra o Londrina, o Vitória reduziu o número de gols nas últimas rodadas. A gente ainda está com uma média alta, pode baixar, mas precisa de tempo e harmonização, acreditar em todos os lances. (…) É difícil mudar o senso comum. Vai sempre em cima do zagueiro. É um conceito comum. Para desmistificar isso, tem que debater, falar mais dessas questões.
Deficiência auditiva
– Tenho deficiência auditiva, tenho 50%, uso aparelho auricular, isso tem suas vantagens e desvantagens. Vantagem é que quando está no ambiente que quer ouvir menos e concentrar, pode desligar. Muito raramente eu desligo. Tenho hábito de assimilar bem provocação, grito da torcida. Numa entrevista falei isso em tom de brincadeira.
Sistema de marcação
– Futebol é muito dinâmico. É um todo. A gente não dissocia. A gente dissocia para vocês, mas acontece tudo ao mesmo tempo o tempo todo. Você está atacando, mas tem que ter cuidados defensivos. Tem uma nomenclatura que é “atacar marcando”. Quando está atacando, seus homens aqui atrás estão encostando no adversário para não permitir que recebam a bola em liberdade. Se o jogador tem mudança de comportamento ´rápida, está fazendo transição. Têm jogadores que fazem essa transição em milésimos de segundos. Quando faz de forma isolada ou demora de fazer, faz efeito cascata.